Silvinho e Pepa - capítulo 1

Existem dois tipos de puxa-saco.

O convicto é aquele que toda hora faz questão de elogiar o chefe e encher o saco dos colegas exaltando suas supostas qualidades. Também está sempre pronto a copiar expressões verbais, comentários e outros comportamentos do superior. Sem mencionar, é claro, a constante disposição para dedurar os colegas de trabalho.

Já o prático é apenas frio e calculista, e mesmo que não concorde com ordens e idéias, faz o figurino. Está ali a postos para adular, imitar e presentear. Mas em geral não entrega o cara da mesa do lado. Também não perde tempo na cerveja depois do expediente torrando a paciência com historinhas de iluminação profissional que presenciou naquele dia.

É certo afirmar que o tipo perigoso é o puxa-saco convicto, já que cumpre seu papel com fé. E a fé move as pessoas.

Silvinho era do tipo convicto.

Há três anos sentia um frio na barriga toda vez que chegava no escritório da fábrica de fertilizantes e topava com aquela sumidade da produção de esterco. Ver Pepa em ação era uma bênção de Deus.

Ao invés de “bom dia” ou “tudo bem?”, a saudação do capacho tinha um caráter mais prático. “Trouxe uma Coca-Cola pra você”.

A anciã, além de habilidosa em fomentar tais comportamentos, se divertia e estimulava o menino. E para disfarçar a coisa toda, dava ao papel ridículo do funcionário um jeito de piada. Todo mundo ria, é claro, já que este é o efeito geral da piada de chefe.

Silvinho não era visto em rodinhas de maledicência sobre o desempenho de Pepa. Ou melhor, essas rodinhas logo se dissolviam quando o sujeito dava as caras.

Afinal, o cara era um agente infiltrado. Mas era um espião sem nenhuma sofisticação. Ouvia e repetia depois. E todo mundo sabia disso. Mas Silvinho não percebia bem as coisas, porque a fé move as pessoas...